TRINDADE SANTA: Ícone da comunidade... (Cf. A. Palaoro SJ)

A festa da Trindade nos mobiliza para uma nova maneira de viver e de nos relacionar com o Deus Comunhão de Pessoas. A Trindade “des-vela” a maneira de ser de Deus, como Amor que se expande, em si e fora de si, de uma maneira “redentora”, inserindo-se na história da humanidade. Deus é Amor e só amor.

Diante da presença e da ação do Deus Trinitário, afogam-se as palavras, desfalecem as imagens e morrem as especulações. Só restam o silêncio e a adoração.

Contemplemos o Icone de Andrey Rublev (1360-1430: da Trindade pensada à Trindade adorada.

A Trindade Santa não é fácil de ser representada. Aqui o artista representou-a na figura de três anjos peregrinos, assentados à mesa de Abraão.

O quê vemos neste ícone? Três anjos, reconhecidos por suas asas, assentados em torno de uma mesa. Os três sustentam um cajado na mão (Trindade Peregrina).

Trata-se de uma representação do relato da hospitalidade de Abraão, Gn 18, quando o Senhor apareceu-lhe na planície de Mambré.

Abraão os convidou a descansar e lhes ofereceu uma refeição. A tradição patrística viu nesses visitantes uma figura das três pessoas divinas.

Podemos nos aproximar do ícone a partir da beleza. Num primeiro olhar, a divindade aparece revelando-se como uma grande luz que atrai e purifica.

A ausência de sombras no ícone quer fazer refletir a luz divina em tudo, e situa-nos diante da santidade de Deus. Tudo está no mesmo plano celestial. O ícone nos remete ir mais além do visível, para a beleza das realidades divinas que representa. A razão emudece, o coração admira: o mistério trinitário ou o “excesso de Deus”.

Observe o ritmo, o movimento circular que invade todos os elementos do ícone, convidando-nos a entrar no mistério de Deus: parte do Pai, passa pelo Filho e se consuma no Espírito; movimento de amor que une às três Pessoas divinas.

Trindade é mistério de comunhão, comunidade perfeita. Nenhuma das pessoas vive para si; compenetração que as une e as diferencia.

Tudo isso sugerido pelo movimento dos rostos inclinados. Rostos semelhantes, mas não idênticos.

Quem é o Pai? E o Filho? E o Espírito Santo? Os três têm a mesma atitude de abertura, de respeito, de súplica e de invocação.

Esse movimento se manifesta igualmente ao fundo do quadro. A árvore se inclina para a esquerda do orante, como submetida ao sopro de um vento forte. Tudo está em movimento, porque a vida é sair de si mesmo, é doar-se. O movimento expansivo expressa adoção, efusão, dom, generosidade e graça, que admite, convida o ser humano ao círculo divino. Só as Três Pessoas divinas permanecem no centro.

E os traços das três pessoas? Elas não têm gênero, nem idade; eterna juventude.

Cada um dos três anjos leva nas mãos um cajado alongado e muito fino. São peregrinos. Os cajados declaram que os três vieram fazer morada na humanidade.

O artista não pretendia sugerir pensamentos, mas uma oração. A perspectiva do ícone é orante e convida adentrar na lógica da gratuidade, do espaço místico, até os cumes da adoração.

Não se trata de entender o Mistério da Santa Trindade, mas de adorar e compartilhar. É Deus quem toma a iniciativa de se aproximar dos seres humanos. Como aconteceu com Abraão, hoje a Trindade se aproxima também de cada um de nós. Dentro de nós habitam um Abraão (fé) e uma Sara (razão).

Que a contemplação do belo e do Santo faça brotar em nós a imagem de Deus que é Pai-Filho-Espírito Santo.
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