Os quatro passos da opressão... (Cf. Gilmar P. da Silva)
Assusta a quantidade de pessoas que se encontram em relacionamentos abusivos, em que um dos envolvidos é subjugado e agredido, seja verbal, moral, psíquica ou fisicamente. E quando falamos de relacionamentos, não dizemos apenas da experiência de casal. Relações profissionais, de amizade, religiosas etc. também podem se pautar no abuso.
Porquê alguém permanece numa relação que a degrada?
A pergunta visa entender os mecanismos de aprisionamento, o processo de empoderamento e o romper com sua condição de vítima.
1. As formas mais intensas de humilhação não são impostas de uma vez. Elas começam pequenas e vão crescendo paulatinamente. Existe certa didática na opressão que “ensina” ao outro o lugar inferior da relação. Tudo começa com o olhar do predador. Ao se deparar com as carências do outro, aproxima-se como aquele que irá supri-las. O campo a ser explorado é o de suas feridas, faltas, traumas, insucessos, mas não só. O caçador se camufla com os desejos e sonhos da vítima, atrai com o odor da esperança, e veste-se com a visão de um futuro melhor.
2. O segundo passo é explorar mais a fundo a fragilidade de modo que se gere dependência. É evidenciar defeitos – reais ou não, porque alguns são inventados para que se gere vulnerabilidade – e se colocar como aquele que pode suportá-los; talvez o único. “Você não é tão bom profissional, mas acredito que pode melhorar e por isso não vou lhe demitir”; “Você precisa cuidar melhor do seu corpo, mas eu te amo mesmo assim”; “Você precisa aprender o modo de agir de nossa instituição (Igreja, congregação religiosa, instituição de trabalho voluntário etc.) para realizar o imperativo do seu coração (vontade de Deus, vocação, ideal)...” São as falas dos opressores.
3. O terceiro passo consiste nas “sugestões” de melhora. Tendo fragilizado seu alvo, começam a imposição de normas e deveres. As regras são impostas na figura de liberdade: “Você está nessa relação porque quer... Caso contrário, tudo se acabará e a opção terá sido sua. Você é livre para ir embora, mas se for do jeito que está, você será infeliz. Estou aqui para te ajudar...”. O terceiro passo já vem acompanhado pelo quarto, a ameaça. E assim vai se conjugando fragilização com pequenas compensações como um elogio, um afago, um presente, o que vai ficando cada vez mais raro à medida que as exigências vão crescendo.
As ordens se tornam mais imperativas e começam a surgir punições, e o respeito se acabando, ao ponto de se chegar à ofensa explícita ou mesmo agressões físicas. Nas primeiras vezes acompanha-se de um pedido de desculpa: “Olha o que você me fez fazer!”. Quando se chega a esse ponto, o processo já está concluído.
Uma das soluções está em mostrar outros mundos e possibilidades, afirmar a positividade da vítima, seus valores e dignidade. Por isso os abusadores não gostam que seus oprimidos se relacionem com outros. Se a vítima descobrir o quanto é digna, valorosa, bela, inteligente etc., perceberá que não precisa se submeter a uma meia-vida. Empoderar não é dar poder, mas ajudar a reconhecer o poder que já se tem. A culpa nunca é da vítima. Comece elogiando um fragilizado, pois se a entrada da escravidão foi aí, também pode ser o início de sua libertação.
Uma pergunta: O que achou desse tema?