INÁCIO DE LOYOLA (1491-1556): itinerância geográfica e percurso interior... (cf. Pe. A. Palaoro SJ)

Inácio de Loyola foi um homem dos tempos novos, agitados, turbulentos e transbordantes de novidades que punham em questão o que até então ele recebera. Após sua conversão, um novo “movimento”começa em sua vida e ele passa a viver a aventura do peregrino, com deslocamentos,internos e geográficos. Torna-se peregrino do Absoluto.

Em marcha, sem encurtar os passos, o peregrino avança livre, sem deixar-se aprisionar por nada nem por ninguém. Essa peregrinação interna e geográfica o torna mais humano e religioso.

Nas suas andanças descobrirá que não há uma “Terra Santa”, privilegiada, mas há uma maneira santa de caminhar sobre a terra. É a nossa maneira de proceder na terra que a torna sagrada.

O equilíbrio do corpo, o equilíbrio do nosso psiquismo, o equilíbrio de nossa vida espiritual depende deste enraizamento dos nossos pés.E se as raízes forem sadias, toda a árvore será sadia. É por aí, pois, que devemos começar os nossos cuidados.

A tradição dos Padres do Deserto diz que todos nós temos os pésvulneráveis, muitas vezes feridos e maltratados. Precisamos sermos cuidados e curados no nível de nossos pés; passar dos“pés inchados e feridos”aos “pés alados”.

1º Movimento. Loyola: em direção à própria interioridade.A grande originalidade da história e da vida de Inácio não é a que ocorreu fora, mas a que aconteceu dentro dele mesmo, a descoberta de seu “mundo interior”.

O tempo de sua longa convalescença foi a mediação histórica de que Deus se valeu para irromper na vida daquele homem. Tudo começou com a leiturade alguns livros sobre a vida de Cristo e a dos santos (“Vita Christi” e “Legenda Áurea”). Por aí teve acesso ao Mistério. Lendo-os, ia-se afeiçoando lentamente ao que ali estava escrito... e algumas vezes parava a pensar no que havida lido.(Autob. 5 e 6)

Inácio passou da “leitura do texto”para “leitura de si mesmo”.Este foi o primeiro `deslocamento´ que Inácio experimentou em seu interior. Iniciou-se uma travessia do “texto escrito” ao “texto da vida”. Leituraprovocativa e questionadora, pois provoca o desejo de construir a vida sobre uma nova base.

Imobilizado e impossibilitado fisicamente, Inácio se surpreende escavando e trazendo à tona toda sua capacidade de aventura neste continente inexploradoque é o seu interior em luta. Enquanto seus contemporâneos aventuravam-se na descoberta de novas terras, seu descobrimento é de maior alcance humano. Inácio abre caminhos no seu continente interior, e depois em cada ser humano, deixando-se levar e observando como é levado.

2º movimento. Manresa(Rio Cardoner).
Uma vez ia, por devoção, a uma igreja que estava mais de uma milha de Manresa. Creio que se chama São Paulo, e o caminho vai junto do rio. Indo assim em suas devoções, assentou-se um pouco com o rosto para o rio, o qual ficava bem em baixo. Estando ali assentado, começaram a abrir-se-lhe os olhos do entendimento. Não tinha visão alguma, mas entendia e penetrava muitas verdades, tanto em assunto de espírito, como de fé e letras. Isto, com uma ilustração tão grande que lhe pareciam coisas novas. Não se podem declarar os pormenores que então compreendeu, senão dizer que recebeu uma intensa claridade no entendimento.Nisto ficou com o entendimento de tal modo ilustrado, que lhe parecia ser outro homem e ter outro entendimento, diferente do que fora antes... (Autob. 30).

A experiênciade Inácio à margem do rio Cardoner o conduz à outra fonte, àquela que brota do coração, e que estava ressequida, impedindo-o de reconhecer o murmúrio da água viva.

“Uma água viva murmura dentro de mim e me diz: Venha para o Pai”(S. Inácio de Antioquia)

Foi essa “ilustração” junto ao rio Cardonerque o fez perceber que o sentido da própria existência é deixar-se conduzir pela força do Espírito Santo, assim como as águas do riacho se deixam conduzir em direção ao grande Oceano. Abandona sua solidão na gruta, seu coração se expande e se abre a uma experiência maior.

3º movimento. Jerusalém-Paris-Roma. Seu itinerário não é unicamente geográfico. Mais que um simples deslocar-se, trata-se de um modo de vivere de situar-se no mundo.Em sua breve estadia na Terra Santa, Inácio ficou marcado pela imagem de `Cristo companheiro´que o chama a trabalhar com Ele. Em cada canto daquela terra ele “via” Jesus ocupado em estabelecer o Reino do Pai com o grupo dos apóstolos, companheiros de Jesus e companheiros entre si.

O `chamado´ de Jesus feito aos apóstolos e o posterior `envio´ deles para a missão, marcaram profundamente Inácio, e se encontram refletidas nas meditações tipicamente inacianas: chamado do Reino, Duas bandeiras, e Três binários. Inácio compreende que a terra de Cristoera o vasto mundo de seu tempo.

Para fazer-se presente neste vasto mundo, de uma maneira original e criativa, decide “estudar”.Forma-se em Paris,onde conquista o título de Mestre em Artes. E ali se matriculou com um nome novo,no dizer de Ribadeneira, “por ser mais universal”: Inácio.

Mesmo no período romano, l541-1556, ano de sua morte, vivendo em Roma, continua peregrino, pois a partir de seu pequeno quarto, se fazia presente em todos os pontos do mundo por onde andavam seus companheiros.

Faleceu no dia 31/JUL/1556.
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