Perda e reencontro do Menino Jesus/Lc 2, 41-50... (cf. Marco Aurélio Souza)

Antes de entrar na contemplação, esta frase “não o encontrando, voltaram...” (Lc 2, 45), pareceu querer dizer-me algo.

Estavam indo de Jerusalém para Nazaré, mas o fato é que invertem o sentido da caminhada, motivado por uma constatação: “Jesus não está mais conosco!” Diante disso, não há motivo para continuar o caminho na direção que estavam indo. Os discípulos de Emaús também voltaram, não porque o perderam, mas sim porque o encontraram. A mensagem é mudar o sentido à partir de uma nova realidade. Na nova realidade de Emaús, encontrando Jesus, retornaram. Os pais de Jesus, desencontrando Jesus, retornaram.
Os dois discípulos voltam porque O encontraram; os pais voltam porque O perderam. O encontro ou desencontro com Jesus, provoca mudanças na nossa caminhada.

Voltar não significa estar correto; mas há necessidade de se detectar o motivo da volta. Os pais voltam porque O perderam. Quem perde Jesus, perde o sentido da vida; deve voltar. No caso dos dois de Emaús, estavam fugindo, e encontrando o Senhor, voltam.

Temos a seguinte situação: os pais de Jesus estavam indo no caminho correto (em direção à casa, à comunidade de pertença), mas sem Jesus, não tem sentido. Não basta estar indo na direção certa, se ao longo do caminho já perderam a Jesus. Há necessidade de voltar. No caso dos dois de Emaús, eles estavam fugindo da comunidade de pertença; portanto, indo em direção errada. Ao encontrar com Jesus, voltam.

Poderíamos dizer que os discípulos de Jesus representam as tentações da primeira semana: indo no caminho errado, o Bom Espírito lhes faz retornar. Já a caminhada de José e Maria poderíamos dizer que são as tentações da segunda semana: indo no caminho correto, mas sem Jesus, O Bom Espírito impulsiona para voltar e reencontrar Jesus.

Estar indo na direção correta, na luta correta, na bandeira correta, na missão correta, sem Jesus, pode ser uma tentação nossa a qualquer momento. É comum acontecer a seguinte caminhada: uma pessoa vive sem nenhum sentido, propósito ou projeto. De repente, tem um momento que chamamos de “conversão” e, tendo feito a experiência de Jesus, apaixona-se por Ele, abraça-se a causa dEle e muda seu ritmo de vida, seus valores, seus projetos, e abraça uma nova proposta (coisa bonita). Na caminhada, lutando pela justiça, pelo direito dos mais pobres, etc., sem perceber, perdem a Jesus. E, tomando ou não consciência que perderam Jesus, continuam a caminhada, pois a caminhada está correta, a direção está certa – ocorre que está sem Jesus.

Talvez este tenha sido o ocorrido com muitos da teologia da libertação dos anos 70/80. Apaixonaram-se pelo projeto e puseram-se a caminhar... no caminho, perderam Jesus, mas a esta altura, julgaram ser melhor continuar a caminhada, do que retornar e retomar Jesus. Erro histórico! E quando isto acontece, caminhamos, lutamos, levantamos bandeiras, dedicamo-nos a causas nobres, mas como se fosse a nossa luta, a nossa bandeira, a nossa causa, quando na verdade deveria ser a luta, bandeira e causa do Reino (e não nossa!). Enquanto as coisas vão dando certo, tudo bem... a uma altura, a casa construída sem os devidos alicerces arruínam-se e começa a desmoronar. Um casamento iniciado com Jesus pode de repente ficar sem Ele, e continuar a caminhada... um dia rui e tudo acaba. Um projeto, uma missão pode caminhar, e quando fica sem Ele, não se percebendo, tudo acaba um dia, frustrado...

José e Maria RETORNAM a Jerusalém! Embora o caminho deles estivesse correto, a direção certa, o projeto ocorrendo conforme planejado (retorno a Nazaré), ao perceberem que estão sem Jesus, sabiamente retornam. Refazem a caminhada, “perdem um tempo” na vida, mas não perdem o verdadeiro sentido da vida.

Quantas vezes, não querendo perder tempo na vida, deixamos de fazer o que precisaríamos fazer (uma visita a uma pessoa enferma, por exemplo), e quando nos pomos a caminho, o tempo já passou. José e Maria se amam, mas não continuam a caminhada sem Jesus. Eles não deixaram de se amar, mas perderam o sentido. Como uma fogueira que já não tem mais lenha grossa na base, embora o fogo ainda esteja aceso, é questão de tempo para que tudo se acabe.

Na vida de qualquer um, pode até tudo estar indo bem, mas se o pilar básico do sentido da vida – Jesus – não mais existir, é questão de tempo para que tudo vá à ruína. José e Maria perceberam a falta de Jesus. E não perceberam de imediato! Levou alguns dias para perceberem isso. E é assim mesmo a caminhada dos que cremos: deixamo o calor do amor de Deus e vamos nos afastando da origem deste calor. Caminhamos, mas uma hora o frio chega e é então que percebemos que precisamos voltar a nos aquecer no calor do amor materno de Deus.

José e Maria caminharam alguns dias sem Jesus. Parecia normal, como acontece com todos nós quando caminhamos... No entanto, uma hora o frio bate, a necessidade aparece, o coração aperta, o interior grita, o espírito sufoca... e então percebemos que perdemos Jesus...
Lamentar? Xingar? Revoltar? Denunciar? Brigar? Lastimar? Gritar? Nada disso resolve! Só uma coisa resolve: voltar ao lugar onde Ele está, reencontrá-lo, e levá-Lo consigo novamente. Após os pais de Jesus o encontrarem no Templo, o menino volta com eles, e eles refazem o mesmo caminho que estavam fazendo antes... A diferença é que agora Jesus está com eles.

Senhor, fazei que eu tenha sensibilidade de perceber quando meu caminho está sem Você e que eu tenha discernimento e coragem para voltar no caminho, alterar a rotina, mudar a agenda, retificar a caminhada, para depois até fazer a mesma caminhada com Você. Amém!
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